Comprou a passagem, tomou uma água e desceu a escadaria do terminal da Barra Funda. Impressionava-se sempre com cada detalhe daquela cidade, desde uma trinca na parede até a civilização a perder de vista. Havia quatro cadeiras destinadas ao acomodo de quem esperava pelo ônibus com destino ao interior. Olhou bem para quem as ocupava: uma senhora gorda comendo um Club Social e ralhando com sua criança, sentava-se na última da esquerda. De tão espaçosa, achava-se no direito de deixar sua bagagem na cadeira ao seu lado. Na última da direita, encontrava-se um rapaz jovem, de boa aparência. Um rosto de expressão fechada, com sobrancelhas expressivas, mas com traços de jovialidade.
Sentou-se, então, na cadeira que lhe restava, entre os trecos da gorda e seu companheiro de juventude. Lá estavam. Todos mirando de esguio o grande relógio branco à espera das quatro da tarde; a mulher comia e xingava, o moço fechava a cara e lia e ele espiava tudo aquilo.
Não mais que de repente, ela desce das escadas. Tinha na certa tanta idade quanto os dois rapazes, mas demonstrava muito mais segurança e desenvoltura pra viver, apesar de estar perdida naquele lugar. Trajava um vestido de cor clara, um palmo acima do joelho. Um ligeiro decote, justamente daquele que deixa qualquer homem doido, a fim de não escachar os peitos, mas sim de estimular o olhar para mensurar o real tamanho. Tinha pernas bem torneadas - e depiladas, diga-se de passagem -, andava com graça a despeito de sua confusão, como já informei. De pele branca e corada pelo sol e cabelos claros, nos quais usava algum apetrecho que determinava sua personalidade.
Ela vinha de frente enquanto os rapazes acompanhavam seu trajeto, passou por eles e foi mais adiante, deixando visível a sua bunda. Bela bunda, redondinha e pra cima, desenhava o vestido e tinha um sincero rebolado: um daqueles que não imploram para serem vistos.
Foi até lá, e voltou ainda perdida a procura na certa da plataforma correta, passou mais uma vez por eles que se perdiam em olhares. Foi nessa que um flagrou o outro a fitar a garota. Quando assim perceberam - sequer se conheciam - olharam-se seriamente, ergueram as sobrancelhas e fizeram um biquinho, o sinal que traduz em toda sua essência “Você viu que gostosa, rapaz?”.
Comentários
Certas coisas na vida têm esse poder, de amálgama,pela estupefação que causam.
Não é a mulher em si, não é a libido.
É a arte. É a beleza!!!
ô Marcelo, vejo que és amigo do café pequeno e fã do Zé Ramalho. rs.
A respeito dessas mulheres que causam estupefação, indico um blog, erguendo a sobrancelha.
Chama-se E Deus Criou a mulher. Não sei o endereço de cor, mas vc o acha lá no meu blog, o submundo. Falou!